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O meu parto dava um blogue

Durante algum tempo foi este o título que me viveu na mente para dar nome a este cantinho. Era sobre isso que queria e precisava falar. O que aquele dia me fez, o que deixou em mim e o que levou. Mas depois não era só disso que queria falar porque acredito que, aos poucos vou ser mais do que essas marcas. Também queria falar deles, de nós, dos nossos dias, enfim. Escolher esse título seria muito redutor.

Mas uma certeza tinha, a de que  escreveria um post com esse título. Tinha que escrever sobre isto porque se fala pouco do lado menos cor de rosa da maternidade e eu senti-o na pele. Ah se senti.

Esperei ansiosamente por aquele dia. Os últimos dias então eram intermináveis e só tinha 37 semanas. Mas via toda a gente a chegar às 40/42 e eu não queria. Não queria mesmo! E tive essa conversa com o meu filho que, mostrando já o doce de menino que era, fez me a vontade.

No dia 25 de Setembro, com 37 semanas e cinco dias o G. decidiu vir ao mundo e ele foi a única coisa boa que ficou desse dia.

Não foi o melhor dia da minha vida. Não. Tive muitos melhores dias nos nove meses que o antecederam. Adorei estar grávida e sonhei com aquele dia vezes sem conta. Mas nunca o sonhei assim. E foi isso. Foi o facto de ter sido totalmente diferente do que sonhei que quebrou todo o encanto.

Não foram as dores das horas que estive sem epidural num bloco de partos cheio, onde os anestesistas não tinham mãos a medir. Não foram as 14h à espera da dilatação completa (porque há quem espere muito mais). Apesar de tudo eu ia mentalizada para a dor e para o sofrimento.

Foi sim o vazio que senti mal o meu filho nasceu. Não era um vazio dele, era um vazio de mim. Ele nasceu perfeito embora tb dorido da batalha que foi. Eu é que estava imperfeita e isso nunca mais ia mudar.

Os dia seguintes, seis dias de internamento foram os piores da minha vida. Uma sutura enorme, dores lacinantes e a sensação que podiam ter feito mais por mim.

Por exemplo, uma cesariana quando viram que a cabeça do G. vinha mal posicionada. Quando perceberam que seria um parto dificil e provavelmente instrumentado. E foi. Pouparam  uma cesariana  (palmas que se vão cumprindo as metas estabelecidas) mas gastou-se uma ventosa uns fórceps e deixaram se sabe-se lá que sequelas. O tempo o dirá. Tenho pena que as marcas que carrego para a vida não estejam contempladas num orçamento de estado.

Valeu-me o colinho que o meu filho me deu. Sim porque foi ele que me acolheu a mim e não eu a ele. Valeu-me o abraço do N. que eu ansiosamente aguardava todos os dias. Ele que por traz do brilhozinho nos olhos cada vez que contemplava o G. trazia também gravado tudo aquilo a que assistiu. "O nosso filho é lindo mas não quero mais nenhum. É  muito sofrimento"

Fisicamente tive dores terríveis mas o que mais doía era sentir que aquilo não era nada do que sonhei. Não sonhei passar os primeiros dias do meu filho em lágrimas, não sonhei que tratar dele fosse quase impossivel pelo esforço hercúleo que era levantar-me e andar. Não sonhei deixar de sonhar ter outro filho. Mas deixei.

Amo este filho mais do que tudo. Jamais esquecerei o toque da pele dele acabada de nascer na minha. Sei que há coisas muito piores e que ainda podia ter corrido pior. Mas aquele dia é uma ferida aberta que ainda não tive tempo de curar.

Comentários

  1. Como te compreendo Sara! Eu estive grávida muuito tempo!Descobri bem cedo (4 semanas) e fui até às 41semanas! Ele estava bem instaladinho! Eu adorava estar grávida, apesar dos últimos tempos serem mais difíceis, cansaço, insónias, ansiedade! Mas era algo que já estava habituada a estar, foi muito tempo e gostava, queria-o ao pé de mim mas a realidade não era de todo a que se desenrolou no parto e pós-parto. Como toda a grávida, pensa no parto, e sonha com uma coisa que muitas vezes (talvez a maioria das vezes), acaba por ser outra. Eu tentei não pensar muito, mas com tanto tempo foi inevitável! Só comecei mesmo a pensar nele mesmo já nas últimas sema as.. e ficava a imaginar, "será que me vão rebentar as águas?", "eu secalhar nºão vou querer epidural".. balelas.. nada se prevê, tudo se decide e concretiza na hora H.

    Ele estava previsto para 24 de Setembro, (engraçado), mas só chegou a 3 de Outubro com parto induzido. Não tive muitas horas (11h depois do comprimido), sofri de contracções mas as verdadeiras fortes só a partir das 17h da tarde (ele nasceu às 22h), levei epidural mas muito pouca, que passou logo a meio do parto pois só levei uma dose as 19h. Eu não sabia fazer a força certa! Estava muito nervosa porque não estava a conseguir! Bloqueei, os nervos bloquearam-me, a parteira gritava comigo, parava, olhava-me nos olhos com um ar mortífero e dizia que assim o meu filho não ia sair.. eu sei lá o que ela dizia eu percebia uma coisa, o pai diz que ela dizia outra coisa, eu estava completamente bloqueada de dor! O Martim estava virado para cima.. Ela teve que o virar dentro de mim! Foram dores inexplicáveis, eu dizia que não ía ser das que fazia barulho, mas como tudo o resto, nunca digas nunca, nada se prevê, eu gritei tentando não gritar mas não deu! Ela suava por todo o lado, estava a fazer um esforço incrível para o virar e fazer aquele parto sozinha e sem ajudas! só estávamos os 3..O pai ao meu lado dava-me festas e uma força incrível! Mas eu não estava ali.. Aquilo era surreal.. Estava noutro universo. A parteira disse-me que aquele bebé tinha tudo para nascer já, mas que se continuasse a não conseguir virá-lo comigo a fazer força teria que ser a fórceps. Quando ouvi aquilo chorei, gritei, disse asneiras (ahahah) e fiz uma força qur ainda não sei bem onde a fui buscar! Ela foi buscar uma pasta, abriu a pasta ao meu lado, eu não racicionei o que aquilo era mas.. não dá para pensar! Ela disse qualquer coisa, eu fiz força e rasgou-me! Assim.. Sem eu saber que ia acontecer .. Gritei muito mesmo, eu senti tudinho! A anestesia tinha passado. Quando amigas me dizem que o rasgar e o coser não doiem nada, pois.. Estavam anestesiadas! E rasgou-me mais um pouco.. Ao mesmo tempo que continuava a tentar virá-lo dentro de mim.. Foi mais que doloroso, mas ela começou a sorrir e a chamar pelo Martim e a dizer qe eu estava muito bem, e o pai gritava de alegria comigo "vem aí amor vem aí o nosso bebé!" E veio!!! Sem chorar,, quieto nas mãos dela, a abrir os olhinhos e a olhar para mim! Lindo de morrer.

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  2. O pai chorava e eu só dizia "mas ele não chora?" ahaha..
    Depois foram momentos mágicos.. (tirando o coser), mas ele no meu colo, a mamar, a dormir, a respirar para cima de mim! O cheiro dele.. o toque quentinho.. tudo foi perfeito.. até ao momento em que a realidade me "bateu". As dores, sentimentos estranhos.. o ele não mamar.. ter que fazer solário horas e horas.. chorar com fome e não querer mamar.. os meus sentimentos de culpa..o meu peito a rebentar de dor.. a falta de ajuda, de conversa, de apoio do meio hospitalar. O sair do meu quarto a chorar e pedir que alguém me fosse ajudar e ninguém vir.. os problemas familiares que aconteceram logo logo nos dias ainda no hospital, tanta coisa a acontecer.. que o momento em que eu julgava que iria estar mais feliz, estava cabisbaixa, cansada, cheia de culpa e incertezas. Os momentos mais doces eram os que o tinha ma minha cama a olhar para mime e eu para ele, ele a dormir na minha mama, tudo o resto foi verdadeiramente assustador. Assim como as semanas seguintes, tantos momentos maus que estava a ser demair para mim. Nada nem ninguém nos prepara para esta fase, quando coisas menos boas acontecem. O amor por eles supera mesmo tudo, mas só quando estamos a olhar e a cuidar deles, porque quando ficamos a sós connosco mesmas, choramos, sentimo-nos mal.. e é preciso muito apoio, muito mesmo! Mas olha Sara, sei que o tempo vai sarando tudo.. e irá sarar todas as tuas feridas. Acredita que a mim já sarou tudinho, e eu quero e continuo a querer o 2º e o 3º ahaha.. também vais querer! :) beijinhos

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  3. Quando vejo as vossa historias, da medo e so penso que em Portugal somos tratadas como animais, mesmo pior que isso. Levar uma mulher a um tal sofrimento num momento tão duro que é este de um parto. Eu tive sorte tive o meu bebe na suica e aqui somos tratadas com muito respeito, ainda me lembro do olhar de ternura da Sage femme (parteira). Tive o meu bebe dentro de agua num hospital publico e pedi muito pela epidural, que nem cheguei a levar, porque a agua ajudou a dilatar mais rápido. Devido à ajuda da parteira e da agua, tambem nao levei pontos, sorte talvez, porque O meu M. veio as 41 semanas com 4,04kg.
    Espero que o amor por os vossos filhos ajude a apagar aquela dor e sofrimento vivido.
    Beijinhos e muita saude para os vossos meninos :)

    Dina Branco

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  4. Querida Sara! é com um sentimento de esperança que te escrevo. Tenho dois filhos maravilhosos e duas experiências de parto diferentes, embora ambas com o final de cesariana. Num foram 38h de dilatação de 5cm sem medicamentos, e no outro foram apenas 8h sem medicamentos. Tive sorte de ter sido acompanhada por várias equipas fantásticas e por médicos altamente sensibilizados que com o tempo deram o fim certo a ambas as situações. A cesariana e a recuperação são experiências altamente debilitantes e traumatizantes - não é um mar de rosas como se poderá pensar. Mas , como o tempo cura tudo, e o amor dos nossos filhos é imenso e viciante, continuo a desejar intensamente um terceiro ou quarto filho. Tenho a certeza que o mesmo sentimento vai surgir em vocês, quando tiver se ser! bjs com carinho

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    Respostas
    1. Obrigada pelas palavras de carinho. Bem sei que teria igualmente sofrido caso a opção tivesse sido uma cesariana, mas as sequelas teriam sido provavelmente menores. Algumas já ultrapassei de outras ainda tentamos perceber a extensão. Tudo a seu tempo.
      Eu já penso de uma forma um pouco diferente. Já falo sem chorar, já falo num irmão. Queria muito dar essa oportunidade ao G. de ver a barriga crescer, de sentir o amor único que se sente por um irmão. Mas o N. continua a não querer. Acho que para nós mulheres, auxiliadas pelas hormonas, acaba por ser mais fácil.
      Mas tudo a seu tempo. Um beijinho

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    2. Olá Sara tenho duas meninas partos diferentes só com uma particularidade nasceram as duas as 41 semanas no hospital Pedro Hispano... A primeira A. teve de ser provocado desde as 8h da manha só nasceu as 21.50h da noite, eu ja cansada de estar o dia todo ali e nada de ela nascer é muito frustrante ouvir os outros bebes a chorar e a nossa princesa não nascia, mas também não tinha dores pois estava com a epidural, as 20h veio uma enfermeira 5* que me disse logo esta bebe vai nascer comigo vamos mama toca a puxar e assim foi as 20.50h estava a minha princesa nos meus braços.No entanto por causa dos pontos nos dias seguintes quase que não me conseguia sentar.
      A segunda M. comecei com contracções as 6.30h da manha e ela nasceu as 8.40h, nada haver com o parto da irmã, nesta não pude levar epidural pois não foram a tempo ;)
      Tudo a seu tempo... Mas cada parto é diferente...
      Beijinhos

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